domingo, março 08, 2009

Autobiográfica em terceira pessoa. (Um artista do sono)

É tarde da noite e ele dorme. Quando dorme, sonha. Por duas ou três vezes, um de seus sonhos se repetiu: sonhou ser um agente secreto. Não lembrava de detalhes, mas quando acordava, sabia que já havia sonhado aquilo antes.
Dentre as milhares de explicações possíveis para a repetição de seus sonhos, tendia fortemente a acreditar que eles eram uma recapitulação de pensamentos conscientes e inconscientes que prespassaram seu cérebro durante o dia, eram uma conferida e organizada nos caminhos de memória que seus neurônios criaram do momento em que acordou até o momento em que adormeceu (não adormecia em um momento, não caía no sono de sopetão: era um lento processo, do qual nunca se lembrava. Por que as pessoas não lembram dos minutos que antecedem o sono? o que acontece com nosso cérebro nesse meio tempo?). Não descartava de todo a hipótese da reencarnação e a das realidades paralelas.
Viu o Batman diversas vezes em diversas situações ao longo do dia, o que, em perspectiva, pode reforçar a relevância desse ícone cultural. Logo antes de dormir, foi à sala assistir cinco minutos de televisão, momentos precariamente ilustrados com um trecho do terceiro filme do homem-morcego. A título de curiosidade, o filme é muito ruim, apesar de seu elenco - Nicole Kidman!
Em meio às ondas de sono, pensa com seus botões que talvez vá sonhar com o Batman, hoje. Certamente seria um bom sonho. O Batman é um herói. Isso lembra de que ouviu Kinks, mais cedo: "celluloid heroes", o disco e a música. Será uma coincidência, e, em caso de negativa, por que isso aconteceu? Será que inconscientemente seu cérebro arquitetou essas relações? Afinal de contas, Já sabia que o filme do batman passaria na televisão, só não lembrava o horário e o canal. Na verdade não lembrava nem do fato, mas vendo o filme a memória veio à tona. Pareceu-lhe claro e lógico: claro, viu o Batman na internet, e quando teve de escolher um CD escolheu justamente o que menciona heróis de celulóide na capa e nas letras. Quando não conseguia dormir, pelo calor e por alguma agonia inexplicada que sente, às vezes, desde criança, teve vontade de assistir TV, sabendo inconscientemente que veria o Batman após algumas zapeadas.
Talvez isso aumente suas chances de um bom sonho. Talvez seja uma coincidência ao acaso. Talvez seja tudo armação do inconsciente. Talvez seja destino. Talvez sejam as três coisas - se é que destino e acaso possam coexistir.
Quando esteve em frente à televisão, teve uma vontade gigante de expressar-se artisticamente, de criar. Talvez seja coincidência. Talvez um anjo ou um espírito tenham soprado a idéia em seu ouvido. talvez seu cérebro tenha usado esse artifício como uma maneira de botá-lo em frente ao computador, fazê-lo escrever, refletir sobre esses assuntos e mostrar à sua consciência o poder que o inconsciente tem. Talvez o anjo queira demonstrar sua existência. Talvez o espírito. Talvez nada disso, ou talvez simplesmente nada. Agora, não importa. Ele está adormecido, e talvez sonhe que é um agente secreto pela quarta vez - ou milésima, das quais 996 ele não se recorda.